domingo, 30 de novembro de 2008

Vagabundo

O nevoeiro é fumo que cega a alma da alegria que os outros esboçam, onde a indiferença de pessoas que achei valer a pena, transforma o sangue de minhas veias em veneno pronto a ser destilado por minha boca de forma a causar dor. O ódio é revoltado pela descrença da raça humana e a noite não é suficientemente escura para esconder a solidão e o desgosto que meus olhos transmitem em dias que o meu coração esgota-se de emoção.
Pacificamente a noite chegou ao céu estrelado por montes que esconderam o sol e onde se ecoam gritos de esperança. Encontro-me perplexo de tédio pela vida que levo, onde me criticam por qualquer ínfimo pormenor e sou julgado por ser uma pessoa que não ombreia o sue nome.
O presente lembra-me o passado, um passado que não consigo lembrar e um futuro que não sei, mas pressinto que o esquecimento veio para ficar e é aí que meus olhos fraquejam para não verem a realidade e o coração esmorece pela dignidade. Hoje está a chover e eu estou feliz, não só porque sempre adorei ouvir chover, mas porque significa que não sou o único a estar triste.
A luzerna do sol já me acorda, mas hoje não me sinto capaz de enfrentar a realidade, porque já não sei como combater a desilusão de ter perdido o pouco que tinha. Os carros hoje vão ter de se arrumar sozinhos, porque a noite não foi suficiente para me fazer esquecer que estou entregue a mim mesmo e que as poucas pessoas que me falam são os meus companheiros de residência de céu aberto e os voluntários da misericórdia que me ajudam a sobreviver.
Quando era pequeno adorava esta altura do ano por causa das prendas, dos enfeites de natal e da amabilidade das pessoas, mas agora que sou um mero vagabundo passam do outro lado da rua para não olharem para mim. A minha família morreu no dia em que me deixou de tratar como um inútil para me tratar como um desconhecido e então fugi para longe das suas acusações, das pessoas que me apontavam o dedo por não ser como elas.
Tenho saudades de alguns familiares e amigos, mas quando já vou na segunda garrafa de vinho para me aquecer sobre as condutas do metro nos meses frios, esqueço-me daqueles que deixei e adormeço na esperança de um dia ter coragem para os enfrentar. É verdade eu fugi para não desiludir e magoar as pessoas que amo, não consegui lidar a minha “ódiodependência” e dupla personalidade que me excluíram de ser um miúdo normal. A chuva fria bate no meu corpo como murros e salta nas pedras desgastadas que tantas vezes contei para adormecer do passado que tenta esquecer para não sofrer.

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